December 30, 2008

excertos literários [cardinal]004

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A morte vem sempre a caminho mas o facto de não sabermos quando chegará parece afastar a natureza finita da vida. É essa terrivel precisão que odiamos tanto. Mas, como não sabemos, pensamos que a vida é um poço inesgotável.

No entanto, tudo acontece apenas um certo número de vezes, na verdade um número muito reduzido.

Quantas vezes mais recordarás uma certa tarde da tua infância , uma tarde que é, tão profundamente, uma parte do teu ser que nem podes conceber a tua vida sem ela? Talvez mais quatro ou cinco vezes. Quantas vezes mais contemplarás uma lua cheia a erguer-se? Talvez vinte.

E, no entanto, tudo parece ilimitado.

O céu que nos protege, Paul Bowles, Assírio e Alvim, p. 239, 2004

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December 29, 2008

não sou capaz. agora não.
resistir ao verbo velado até não aguentar.
luto. período de nojo. inacabado.
com tudo e com tão pouco.

viúvo, que precisas tu?
tempo. não há. não há tempo para sempre.
a vida em revista. surdina.

não chores.
sal. já pouco tens.

tens um jeito curioso de ser. ensina-me.
ensina-me a não ter medo. a não querer muito.
a ser contentinho. a amar. a contar fábulas.
a ser. quem?

December 28, 2008

.esquisso

roubo da esclerose
com aptidão para o agir inerte
na incapacidade de gozar

foges fujo fugimos
irregularidade de actos no mesmo tempo
semelhante castigo
recompensa farta

guerreiro outrora caído
por amores e guerras de outros
resiste à opressão do querer
heroicamente sozinho

e agora sem ele
conseguirás também
dizer: eu posso pontodeinterrogação

December 25, 2008

December 24, 2008

.e escrita

procuro entreter-me e arranjar que escrever neste caderninho. leio. e escrita nada. caderno lindo.
tenho uma corda ao pescoço devidamente enlaçada, na expectativa de um erro. devidamente enlaçada, que mais tarde ou mais cedo exercerá a sua função de corda.
belo adereço, no sentido estético do termo. fica-me bem.

dói-me sinceramente quando te dói. e escrita nada.
padeço-me contigo. sei o que isso é. e escrita nada.

em jeito de poema, queria ensaiar qualquer coisa, mas sinto-me, sou assolado por um tufão de ideias confusas e difusas. ena, rima. não foi propositado. afianço. esquissos.
e escrita, qualquer coisa.
retomando a coisa, sei bem que estou confuso, e o querer muito e muito agora, espatifa o pouco entendimento, que em verdade, creio ter.

sei muito bem, que já leste coisas melhores, e agradeço-te com profunda sinceridade, o dispêndio do tem tempo escasso. que te vai faltando. Sim, pois se não sabes aviso-te:
isso, isto da vida é efémero. afianço-te.

o natal também cheira a morte.

here i shall loose or fall.

estou como a maria, ou como julgo que ela esteja. seja. é. estes verbos. merda. estou como a maria, que não pode não escrever. não há desmamo para isso.
bem haver há.

um peculiar jogo de xadrez.

e escrita, qualquer coisa.

December 23, 2008

December 22, 2008

.moleskine

trois cahiers moleskine pour les poemes d'amour.
second coolest christmas gift so far. thought you might like to know
sinto falta dos poetas que invejo.

December 21, 2008

It's a wonderful life, Sparklehorse




i don't know. whenever i hear this pretty song, i feel butterflies on my belly. i think of tenderness, tender moments, and tender love. i know your feeling now, lonesome cowboy.

http://www.myspace.com/sparklehorse
http://www.sparklehorse.com/

amazing video by the way

December 16, 2008

quero o outono que nunca fiz

.in respondeo

terna. eu disse-te que eras terna. e nada poderá mudar isso. sei que sou um rapaz um tanto estroina. cinzento. muito. cinzento. num país e cidade onde o cinzento é feio, e onde todos se julgam de côr bonita, não o sendo. e onde mais ninguém é cinzento. muito. cinzento como eu.

o teu batonzinho. escarlate. causa de inveja. ali! olha, vês-te?
terna, como a menina que um dia há-de ser tua. sentadinha no teu colo a brincar com o escarlate de oz dos teus lábios, e pedir que a beijes, ou lhe dês um pouco dos teus lábios de mãe. de menina-senhora.

o escarlate, esse, sobre todas as formas, vermelho ou encarnaducho, que não te saia dos lábios, nem dentro de ti. eu, só peço para o ver um pouco mais de perto.
tu, continua a ser terna. e menina. muito. menina. tu. a pintar mundo.

excertos literários [cardinal]003

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Não interessava que fosse de manhã ou tarde, sexta-feira ou domingo, era sempre o mesmo: a dor surda, sem parar um momento, torturante; a consciência desesperada da vida ainda presente mas a fugir-lhe; a única realidade: a morte iminente, terrivél, odiosa; e a mentira constante.

Que importância tinham os dias, as semanas, as horas?

A morte de Ivan Iliich, Lev Tolstói, Relógio D’Água Editores, p. 72, 2007

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December 13, 2008

a insustentável tensão para te ter

o querer que ontem atormenta que tira o sono
a ausência de nós no amanhecer da esperança
[renovada

renovado desejo

a cada passo ou pulsar das estrelas
que prometi oferecer-te
reapareces fugidia

as sombras são malandras
não nos querem bem
querem-te a ti ti t i t i

renovado desejo

a esperança infantil contagiante
destrói as poucas capas que possuo
descobre o peito mostra-te o melhor de mim

não subsiste a razão apenas

um renovado desejo

e

a insustentável tensão para te ter

December 12, 2008

sans titre [cardinal]001

o el dourado não tem coito
as palavras que nos fogem os olhares cansados
os sexos lânguidos as mãos frias

sem i’s nem pontuação
desnecessária


o teu peito contra o meu na tentativa da fuga
para o altar da redenção


vem-te e vai-te embora
abandona quem já não respira
não me peças mais que tudo falta


aqui jaz o último e o primeiro
daqueles que recusaste e daqueles que tentaste

amar…


dançamos um pouco mais?

December 11, 2008

poesia musicada [cardinal]002

Dance Me To The End Of Love, Leonard Cohen, Various Positions
rel. date: 1984

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Dance me to your beauty with a burning violin
Dance me through the panic 'til I'm gathered safely in
Lift me like an olive branch and be my homeward dove
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love
Oh let me see your beauty when the witnesses are gone
Let me feel you moving like they do in Babylon
Show me slowly what I only know the limits of
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love

Dance me to the wedding now, dance me on and on
Dance me very tenderly and dance me very long
We're both of us beneath our love, we're both of us above
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love

Dance me to the children who are asking to be born
Dance me through the curtains that our kisses have outworn
Raise a tent of shelter now, though every thread is torn
Dance me to the end of love

Dance me to your beauty with a burning violin
Dance me through the panic till I'm gathered safely in
Touch me with your naked hand or touch me with your glove
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love

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ainda que não tenhas talento, danças assim comigo?

December 10, 2008

excertos literários [cardinal]002

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A situação apresentava-se sob um ângulo muito diferente. [...] não se trata do ceco, mas da vida... e da morte. Sim, a vida agora a extinguir-se, a fugir-me, e não posso agarra-la. Sim. [...] estou nas últimas. [...] onde havia luz, agora há trevas. Ainda estou cá, mas vou para lá! Para lá onde?
[...]
Deixarei de existir, mas o que existirá então? Nada. Mas onde estarei quando não existir? Será mesmo a morte? Não, não quero.
[...]
Mas não pode ser que todos, e sempre, estejamos condenados a este medo terrível.

A morte de Ivan Iliich, Lev Tolstói, Relógio D’Água Editores, p. 54, 2007

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December 9, 2008

UNKLE feat. Tom Yorke - Rabbit In Your Headlights

"Raisparta! maçarico de um raio! palerma! porco! safardana!" – outras coisas que tais que não convém escrever em virtude de se querer preservar bons costumes, e por ser sobretudo, muito desinteressante. Enquanto praguejava, eis senão que depois de ouvir a valsa dos tati, entra-se-me pelos ouvidos esta melodia, bela, bonita eu sei lá. Uma boa pianada e o thom a cantarolar. Praguejei de novo mas foi de contentamento. Já não ouvia isto desde que a voxx morreu. Hoje há internet. Fica aqui para quem não conhece. Esta pérola é linda. É muito linda. Fazei o favor de divulgar.


UNKLE feat. Tom Yorke - Rabbit In Your Headlights

December 4, 2008

excertos literários [cardinal]001

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Ceiam e vão-se embora, e Ivan Illitch fica sozinho com a aconsciência de que a sua vida está envenenada e de que está a a envenenar a dos outros, e de que o veneno não perde força mas cada vez se infiltra mais em todo o seu ser.
[...]
E tinha de viver assim, à beira da morte, completamente sozinho, sem uma única alma que o compreendesse e tivesse pena dele.

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A morte de Ivan Iliich, Lev Tolstói, Relógio D’Água Editores, p. 50, 2007

December 3, 2008

poesia musicada [cardinal]001

mount eerie, lost wisdom
rel. date: oct., 2008

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i got close enough to the river that i couldn't hear the trucks
but not close enough to stop the roaring of my mind
these rocks don't care if i live or die
everyone i know will finally turn away
i will confuse and disinterest all posterity
lost wisdom
is a quiet echo
lost wisdom
by the edge of the stream at dusk
is a quiet echo on loud wind

with one hand in the water running cold and clear
fog obliterates the morning and i don't know where i am
the heart is pounding and you are always on my mind
lost wisdom
is a quiet echo
lost wisdom
a boulder under the house
i used to know you
now i don't

the screaming wind said my name
i think significant and dark
my lost face in the mirror at the gas station
who are you but my face that i wake up with alone
lost wisdom
approaching shape in the low light

you thought you knew me
you thought our house was home
i thought i knew myself
i thought my heart was calm
thunder lightning
tidal wave
the wind blew down the door
lost wisdom
the river goes through the room

i saw your picture out of nowhere
and forgot what i was doing
everything vanished in your eclipse
a constellation of moments comes to life in the void
lost wisdom
face down under the moss
enraptured by the beautiful face in the billowing flames
i open the front and back door and let the wind blow through
and i stood in the house and tried to hold the breeze
lost wisdom
waking up in a pile of ash
secret knowledge
comes to me in the dusk
showed me the river
i saw me

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December 1, 2008

Rua x, à bica

Três portas, outras tantas fiadas de janelas, cinco campainhas. A cidade e o rio. A chuva que amiúde cai e procura esconder as lágrimas da viúva, que recorda o abandono dos filhos.
A viúva mora na segunda janela do lado esquerdo, no piso em cima ao do senhorio alcoólico, também ele viúvo. Mas esse procura mais recordar as garrafas cheias do que mais gostava: Macieira. O brandy português, que quando acabava, ora o fazia chorar que nem uma criancinha, ora recolher as rendas do mês repassado.

O texto era para ser um pouco mais taciturno, Outonal e poético. Mas não sou capaz de escrever absolutamente nada de extraordinário. Começo bem, com a viúva, e depois com o alcoólico. Pretendia deter-me na vida da senhora, que de facto vive naquele prédio do Bairro da Bica e naquela janela em particular, e se esconde das janelas quando os dias estão agradáveis, e apanha sol como ela diz, apenas quando chove. Assim ninguém vê a sua tristeza. Toda a gente é triste. Mas poucos os que se apercebem disso. É como as maquinas: tudo uma questão de afinação.

Sinto-me completamente desinspirado para escrever alguma coisa com perspectiva, – ou profundidade como se queira – ou sobre a beleza. Sim sobre algo bonito. Sei o que é algo bonito, porque conheço algumas coisas bonitas.

“Esforça-te!” diz-me uma amiga com interesse e preocupação, mas a coisa não funciona assim. Não há poesia nem beleza à força. O ser da beleza, como disse a minha amiga está na chuva desta tarde. É tudo, tudo, e sempre, uma questão de afinação.

sans titre

i wanted to kiss her, but i wasn't sure where my feelings pointed to.